Estamos quase no fim do especial sobre Oscar, agora vamos para mais dois concorrentes do prêmio de Melhor Filme.
Boyhood: Da Infância à Juventude
Filmado num período de 12 anos, com o mesmo elenco, Boyhood conta a história de um casal divorciado, Mason e Olivia, criando seu jovem filho, Mason Jr. A história acompanha o garoto por esses 12 anos, desde quando ele tinha 6 anos até os 18. Nesse período, vemos a relação desse jovem com seus pais e todos a sua volta, enquanto ele cresce.
Boyhood gera uma grande identificação com pessoas nascidas na década de 90. Principalmente os americanos, claro. Esse filme parece mais um estudo sociológico do que um trabalho de arte. E, por sua abordagem tão diferente, impressionou muitos críticos. Aqui a teoria de Marshall McLuhan, sociólogo canadense que vislumbrou a internet trinta anos antes dela ser inventada, prevalece, “o meio é a mensagem”. Por estar no cinema, essa é uma história importante. Se você visse essa história em outro meio, provavelmente passaria batido por ela. Viva a “geração reality show” … Hurray…
A maior conquista de Boyhood é que ele foi filmado/produzido no período de 12 anos. Se prepare para ler isso um bocado de vezes. Com isso podemos ver o elenco, principalmente as crianças, mudando rapidamente com nossos próprios olhos. Apenas esse feito já é uma grande conquista. O grande diretor Richard Linklater, responsável pela ótima trilogia “Antes” (“Antes do Amanhecer”, “Antes do Pôr-do-Sol” e “Antes da Meia-Noite”), é um sujeito ambicioso e provavelmente é um dos poucos capazes de realizar um projeto dessa magnitude.
O elenco de coadjuvantes é muito forte, principalmente a performance fascinante de Patricia Arquette como a sofrida mãe solteira Olivia. Do começo ao fim, Olivia encara dificuldades muito reais para pais solteiros: tentando sustentar suas crianças enquanto procura um amor para si. Mesmo tendo Mason Jr como foco de Boyhood, a parte mais forte do filme e a força motora da história é Olivia. E Ethan Hawke consegue convencer magistralmente como o “pai de fim semana”, o sujeito vagabundo, que é o Sr. Mason. As cenas entre pai e filho no terceiro ato do filme são de emocionar.
O problema é que o ator principal não convence. Quando estamos na fase infantil, ainda funciona, o problema é que quanto mais velho o jovem fica, mais forçada fica sua atuação. Ellar Coltrane, que interpreta Mason Jr, não se sente à vontade na frente das câmeras e falta naturalidade em suas falas. Fica difícil rolar alguma empatia com um protagonista desses. Quando o personagem principal do seu filme não convence, é complicado encarar a obra.
De qualquer modo, a passagem de tempo é algo que fica muito claro ao espectador, sem ser didática ou subestimando a inteligência do público. O crescimento de cada indivíduo é estampado sem que isto tenha que ser verbalizado. Não é necessário o uso de datas indicando o ano atual, tudo é dito subliminarmente devido aos acontecimentos verídicos retratados na telona. Essa parte de retrospectiva de mais de uma década é o que conquista muitas pessoas, mas falta desenvolvimento, então no fim das contas acaba que esse recurso só impressiona momentaneamente, não sendo realmente memorável. E para completar a identificação com o público geral, o longa usa de uma ambientação genérica para atingir muitas pessoas com seu estilo real e “sem brilho”, levantando questionamentos e momentos fáceis de se identificar.
É um fato impressionante que o longa exista. Sim, só pela ousadia de filmar durante 12 anos. E merece ser visto pela curiosidade de ver o amadurecimento de muitos anos em poucas horas. Contudo, o primor pela sensação de realidade acaba prejudicando a história. Falta substância, e tirando os pais do garoto, os personagens não são interessantes. Muito porque a maioria do elenco não são atores experientes e isso fica evidente na atuação de boa parte dos intérpretes. E o roteiro é extremamente previsível. Particia Arquette e Ethan Hawke dão tudo de si para salvar o filme, porém não é o suficiente. É um projeto interessante, uma grande experiência, mas não é um bom filme.
Boyhood apresenta em sua maior parte diálogos horríveis, cinematografia chata e um protagonista sem presença e uma vida sem muitos acontecimentos. Ei, a vida como ela é, não é mesmo? Sinceramente, espero que não seja o caso de quem está lendo essa resenha. Mas tudo bem, levou 12 anos para ser feito, e tudo que leva esse tempo de produção é automaticamente bom, certo? Coff, Duke Nukem Forever, coff. É óbvio que os 12 anos de produção reforçaram a ideia da transformação e, sem dúvida, confere um interesse especial ao filme. Mas é apenas isso. A história não tem nada de especial, muito embora o casal principal do elenco, como já dito muitas vezes, seja muito eficiente e carismático. Merece as indicações ao Oscar por sua ambição, merece ser visto por tentar retratar parte de uma vida e trazer um sentimento de nostalgia para muitos. Entretanto, falha no desenvolvimento, no ritmo e no roteiro. É um projeto admirável, só não é isso tudo que andam dizendo. Mas ei, foi o filme favorito de Obama, sim o presidente dos EUA, em 2014. E ele é muito mais inteligente do que eu, então vai saber, certo?
Nota: (2,5 / 5)
Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)
Todo mundo curte uma história sobre começar de novo, do cara esquecido, do fulano subestimado, aquela sujeito que do nada mostra que ainda tem cartas na manga. E o cineasta Alejandro González Iñárritu (“Babel”) nos traz de volta o saudoso ator Michael Keaton em todo seu esplendor. O eterno Beetlejuice e o Batman de Tim Burton vai mostrar para todos porque ele é, e sempre será, um grande astro.
Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) é um conto de ressurgimento, ou melhor, renascimento, de Riggan Thomson (Michael Keaton). Riggan é um ator meio acabado que já viveu um icônico herói nos cinemas, mas com o tempo acabou sumindo das telonas. Soa familiar? De qualquer modo, Thomson planeja seu retorno como diretor e estrela de um musical dramático na Broadway. Tudo no seu projeto, uma adaptação de uma história de Raymon Carver, sugere fracasso à vista. E para reforçar essa ideia de desastre, Riggan é perseguido por uma presença imaginária: Birdman, o papel que lhe deu fama. O “super herói” vive lembrando o ator que ele ainda seria uma estrela se ele deixasse coisas “bobas” como integridade de lado. Será que Riggan conseguirá largar esse fantasma de seu passado e voltar a ter sucesso? Ah, e a história toda se passa em três dias. E nesse meio tempo, Thomson deve lidar com sua família, carreira e sanidade. Eita.
O elenco e os personagens são espetaculares. A co-estrela da peça de Riggan (Edward Norton) é um lunático. As damas principais do projeto (Andrea Risenborough e Naomi Watts) não possuem estrutura emocional alguma. O produtor de Riggan (Zach Galifianakis) é um neurótico, a ex-mulher do protagonista (Amy Ryan) talvez seja a única estável e sua filha (Emma Stone) é rancorosa até dizer chega. Já Riggan altera entre puro deliro megalomaníaco e insegurança total. As cenas mais marcantes do filme são aquelas que “sugerem” que o personagem principal não tem o pé muito preso na realidade. Também com tanta pressão e ego em jogo, dá para entender.
O longa é uma bela farsa dos bastidores de uma peça e tenta passar que tudo ocorre em apenas um longo take. A câmera está em movimento constante. O diretor de fotografia Emmanuel Lubezki (Gravidade) é o responsável por perseguir Riggan em corredores apertados e nas ruas agitadas de Times Square. A trilha também faz seu trabalho, mas a cinematografia desse filme é tão espetacular que é impossível não tirar o chapéu para Emmanuel. De qualquer modo, tanto a trilha quanto a “câmera perseguidora” reforçam a ideia de que Riggan Thomson vive em constante pressão.
Só para você ver como esse filme prima pela perfeição, devido as tomadas em um take, sem cortes, muitas das cenas exigiam que Michael Keaton e o resto do elenco acertassem 15 páginas de diálogo de uma vez. Sem pausas, sem ajuda da edição. Isso que é cinema.
Inãrritu não tem medo de abordar temas polêmicos, o filme trata do ego das celebridades, da parcela de fãs obcecados por super heróis e de críticos de cinema mesquinhos. Pff, pessoas que vivem de criticar o trabalho alheio, vai entender… Ops. Sem contar que a arte imita a vida e faz um paralelo irônico com o astro do filme, o próprio Michael Keaton. Esse grande ator já teve o mundo dos cinemas a seus pés quando era Batman, e depois ficou um bom tempo apagado. É uma comédia de humor negro que voa alto, que ousa em ser diferente e consegue tal façanha. O final inesperado pode broxar algumas pessoas, mas não tira o valor do resto do filme. É o longa que mais merece o prêmio de Melhor Filme no Oscar 2015.
Nota: (5 / 5)
Não deixe de conferir as outras partes dessa matéria:
Oscar 2015 – Críticas dos concorrentes – Parte 01 – Sniper Americano e Foxcatcher
Oscar 2015 – Críticas dos concorrentes – Parte 02 – O Jogo da Imitação e O Grande Hotel Budapeste
Oscar 2015 – Críticas dos concorrentes – Parte 03 – Selma e Whiplash
Oscar 2015 – Críticas dos concorrentes – Parte 05 – A Teoria de Tudo e O Conto da Princesa Kaguya