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Flappy Bird: O pássaro parou de voar

by on fevereiro 10, 2014
 

O popular e gratuito jogo para smartphones não está mais disponível para download. Foi retirado pelo prório criador, o desenvolvedor vietnamita Dong Nguyen. Ele afirmou pelo twitter que “não aguentava mais” . Para uns, isso foi visto como uma vitória para um cara que faz jogos com sinceridade e honestidade. Outros criticavam o criador por alardear que ganhava 50 mil por dia com o jogo (como visto aqui). Nenhum desses discursos é inteiramente verdadeiro.

Caso você tenha perdido o frenesi que esse pássaro que abana gerou, Flappy Bird é um jogo de graça para celulares onde o desafio é guiar um pássaro desviando de diversos canos, variando sua altitude para passar pelo espaço entre eles. Você simplesmente precisa ficar clicando na tela para o pássaro bater as asas, o que parece simples mas é incrivelmente difícil. A pessoa que vos escreve não conseguiu passar do primeiro cano enquanto o Calhorda já chegou perto do 90 e Scud passou dos 100. Não que eu seja um bom exemplo, já que não me apego muito a jogos. Diferentemente de mim, a reação de muitos gamers é uma mistura de frustração e de uma necessidade absurda de continuar. As pessoas odeiam, mas não conseguem parar.

Isso não acontece apenas com o passarinho do abano, ele é apenas uma continuação de uma forma particularmente implacável de game design. Video games são desenvolvidos em torno de um delicado equilíbrio. São máquinas de vício e requerem alguém que opere que esteja comprometido o suficiente para continuar executando as ações do jogo mas que não esteja confortável demais que fique entediado e queira parar. Uma boa forma para garantir compulsão é fazer com que o jogador acredite que sempre pode fazer melhor, e que se não o fizer, essa falha fará com que fiquem bravos com eles mesmos  o suficiente para caírem na armadilha do “loop” e continuem jogando. O criador do Super Mario, Shigeru Miyamoto, estudou muitos jogos arcade populares e concluiu que os jogadores precisavam ficar bravos consigo mesmo, então, a partir daí ele foi tentar analisar como os jogos faziam isso. Ele aprendeu que os jogadores precisam rapidamente entender os limites da sua presença no mundo do jogo, que se os controles são simples e justos, interações com sistemas complexos começam a se tornar compulsivos. No entanto, tudo depende de um equilíbrio.

Shigeru Myamoto precisou realizar alguns testes, por exemplo, para conseguir descobrir a altura que o Mario deveria pular, que fosse fácil o suficiente para usar mas que ainda necessitasse de alguma habilidade. Precisava ser perfeito e era, pois Super Mario Bros se tornou um enorme sucesso.

De forma semelhante, Flappy Bird é baseado em uma simples interação: clique na tela para bater as asas. Porém, claramente Nguyen levou algum tempo trabalhando na altura exata alcançada nesta interação, assim como ele conseguiu fazer o espaço entre os canos de forma correta (o que faz com que eu sempre esbarre na ponta do cano!). A relação entre essas diferentes partes criou uma máquina na qual os jogadores sentem que podem operar, e quando eles falham, eles culpam eles mesmos. Isso é crucial, é o principal fator de vício no design pra jogos, desde Space Invanders até Call of Duty. Um grande sistema de jogo é um espelho dos erros dos jogadores. E Flappy Bird é um grande jogo, visto por este ponto de vista.

Além disso, o jogo gira totalmente em volta de uma ação e a largura dos canos é um pouco mais larga do que a metade da largura do abano do pássaro. Isso força você a fazer uma série de difíceis decisões sobre se e quando clicar no momento em que você está dentro da barreira. Isso mostra o quanto pensar em detalhes finos como esse é muito mais importante, em termos de diversão do jogador, do que adicionar inteligentes mecanismos e detalhes estéticos belos.

Então porque tantas pessoas odeiam o jogo? É muito falado que o jogo copiou os canos do Super Mario. Porém, video games tem se apropriado de elementos do Super Mario por muitos anos. O jogo de plataforma 1987 Great Giana Sisters é um tributo aos títulos da Nintendo e foi bastante elogiado. Uma comunidade online tem crescido em torno de hacks de títulos de Super Mario, com autores adicionando funcionalidades e distribuindo online. Raramente há ganho comercial aí, mas mesmo nestes casos, o ato de remixagem de elementos do Mario é visto como um esforço criativo.

Centenas de outros jogos  famosos ou indies usaram elementos do Mario nos últimos 20 ou 30 anos. Jogos como Super Meat Boy e Braid usaram elementos do Super Mario Bros e nenhum dos dois recebem esse tipo de crítica que o Flappy tem sofrido.

Outros críticos ainda citam jogos como Piou Piou e Helicopter Game.  A história do design de jogos é onde vemos inspiração e plágio mais se confundirem. Os grandes gêneros que conhecemos hoje vem de desenvolvedor pegando ideias de lançamentos de sucesso, mudando e lançando com variações. Tetris nos deu uma era de quebra-cabeças de blocos, por exemplo. É assim que ideias se espalham e evoluem.

Há quem reclame ainda que o Flappy Bird é cheio de propaganda. É verdade, mas onde todos os jogos são de graça há de se encontrar alguma forma de ganhar dinheiro. Desenvolvedores levam meses para programar, testar e lançar um jogo, mas todos querem ter o jogo de graça. Propaganda veio pra pagar as contas uai.

Rumores afirmam que o desenvolvedor forçou o game a aparecer no topo, com comentários falsos. E persistem em afirmar que a remoção do jogo foi forçada, apesar do desenvolvedor negar qualquer pressão legal. Talvez nunca saberemos.

O jogo herdou muita coisa de seus predecessores assim como muitos outros o fizeram. Porém, de alguma forma, fez um incrível sucesso. O que não necessariamente trouxe felicidade ao seu criador, que decidiu tirar o jogo do acesso ao público para não ouvir mais o julgamento da mídia.

De qualquer forma, para quem quiser adquirir o jogo, pode comprar um smartphone usado com o jogo pré-instalado (!!!). Sim, já estão sendo vendidos iPhones pela bagatela de 1500 dólares no eBay. Essas valores astronômicos apenas porque o aparelho possui o cobiçado joguinho. Ou então você pode se contentar com um dos clones alguma-coisa Bird ou outro bicho voador, que já estão surgindo. Flappy Bird não será esquecido, mas sim substituido por seus clones. Fly Bird já é o segundo lugar na App Store. E o mundo continua a girar.

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Tentativa de se livrar do vício…

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